Princípio da Subsidiariedade – Necessidade de Reforma no Sistema de Segurança Pública
Autor: Marcos Bazzana Delgado
Bacharel em Ciências Jurídicas
Pós Graduado em Segurança Pública
“Desde
seu nascimento o ser humano busca autonomia. A criança, quando consegue
dar seus primeiros passos, já dispensa a intervenção do adulto. O jovem
anseia por sair sozinho, escolher suas próprias roupas e manter suas
próprias amizades.
As
pessoas anseiam por autonomia porque, na verdade, aspiram à liberdade. A
liberdade é um valor intrínseco à natureza humana, e a autonomia é a
ferramenta da pessoa livre para a busca de sua felicidade.
Da
autonomia que um ser humano dispõe, ele pode optar por unir seus
esforços com os de um vizinho. A isto denominamos "cooperação"; A
cooperação, derivada da ação humana, é sempre propositada. Seu objetivo é
conseguir um resultado melhor do que a soma dos esforços individuais.
Às vezes, a cooperação torna possível a realização de um objetivo
inalcançável por somente um indivíduo.
Assim
nasceram as primeiras sociedades. A uma forma peculiar de cooperação
humana, denominamos estado (Na Federação – União, Estados e Municípios).
O estado nasceu quando os integrantes de uma sociedade verificaram que
havia necessidades comuns a todos, que deviam ser satisfeitas. Assim, o
estado passou a executar tarefas tendentes a satisfazer necessidades
tais como defesa, segurança, e administração dos bens comuns (ruas,
fontes, etc.).
Eis
que, a este ponto, verificamos o significado de "subsidiariedade". Isto
porque, conforme se pôde verificar pela explanação acima, a cooperação
humana, para ser legítima, há de ser voluntária. Segundo esta linha de
raciocínio, o papel do estado sempre será subsidiário em relação à ação dos indivíduos.
Cabe ao estado tão somente prover aquelas tarefas que satisfaçam as
necessidades reconhecidas por todos como comuns, deixando seus
integrantes à vontade para buscarem a própria felicidade. Cabe ao estado
auxiliar, e não ser auxiliado. Cabe ao estado facilitar a realização
dos projetos individuais de cada ser humano, e não convocá-lo para o que
ele determina ser o projeto de todos.
Em
nosso país, a estrutura consagrada de governo toma as feições de um
centralismo exacerbado, gerando séria crise de representatividade, tanto
para as esferas regionais de governo (governos estaduais), como para as
esferas locais (municípios) e principalmente sobre as pessoas.Daí porque precisamos estabelecer um regime autenticamente federalista.”
Com
base no princípio da subsidiariedade acima descrito, tudo aquilo que
puder ser feito pelo indivíduo e por sua família, deve ser. O que não
puder ser feito em um núcleo familiar, passa para um condomínio ou um
bairro, depois para um município, depois, se não estiver ao alcance do
município, passa para o estado e, só no fim, em última instância, para o
Governo Federal.
“O
princípio da subsidiariedade estabelece que as entidades públicas
superiores (Estado e União), em termos de competências, devem prevalecer
sobre os Municípios somente quando estes, a seu critério, não estiverem
aptos a executá-las de modo eficiente. Em outras palavras, os
Municípios passam a ser reconhecidos no ordenamento jurídico como os
principais e mais capazes agentes do desenvolvimento social, limitados
apenas por circunstâncias que exijam, temporária ou permanentemente, o
aporte de recursos e/ou a gestão das entidades superiores.”
(O PRINCÍPIO DA SUBSIDIARIEDADE E A REDEFINIÇÃO DO PAPEL DO ESTADO NO BRASIL, (Montelello, Marianna Souza Soares 2002)
Subsidiariedade guarda relação com "liberdade" e "autonomia", formando desta forma a "espinha dorsal" do pensamento federalista.
O Estado
Brasileiro é uma Federação, ou seja, trata-se de um Estado composto,
formado por um conjunto de outros entes autônomos, nos termos da
Constituição.
A Magna Carta
de 1988 passou a considerar os Municípios como entes da referida
federação, tratando-o como uma unidade dotada de autonomia política,
expressa na capacidade de poder elaborar a sua Lei Orgânica, fugindo
assim, da tutela dos Estados.
O Município, a partir da promulgação da Constituição de 1988, adquiriu inegável “status” de ente federativo.
Não há hierarquia entre os entes federados. O município não se subordina ao estado, nem esse à União. Há sim autonomia.
Temos
então que, por este princípio, o ente federal mais importante, que mais
está próximo do cidadão, é o município, pois, na ordem de atendimento,
seria o primeiro provedor das necessidades que não podem sozinhas serem
realizadas pelo indivíduo nem por pequenos grupos. Também é o mais
importante porque é nele onde as coisas acontecem. É nele onde se
discutem problemas e soluções de interesse local. É ele o verdadeiro
palco da vida.
E a segurança pública, seria assunto de interesse local (municipal), estadual ou federal?
Acredito
que Segurança Pública deve ser vista e trabalhada em três níveis.
Acredito que o Sistema de Segurança Pública Brasileiro contido no artigo
144 da Constituição Federal deve ser revisto com urgência, com a
redistribuição das competências para cada polícia, em cada âmbito da
federação.
Há
problemas criminais que devem ser tratados em âmbito de Segurança
Nacional – Ex. trafico internacional de pessoas, terrorismo,
contrabando, crimes de imigração, trafico internacional de drogas,crimes
contra a ordem econômica, crimes de trânsito praticados em rodovias
federais etc. Há problemas criminais que devem ser tratados em âmbito de
Segurança Nacional Segurança Estadual – Ex. crime organizado em âmbito
estadual, crimes de trânsito praticados em rodovias estaduais etc. Assim
como há problemas criminais que podem e devem ser tratados em âmbito de
Segurança Municipal – Ex. roubo, furto, lesão corporal, homicídio etc.
Citamos
acima alguns exemplos, porque, obviamente, uma relação taxativa dos
crimes, e a que ente federativo caberia a sua prevenção/apuração/solução
demandaria longo estudo, infindáveis debates, e possíveis composições,
isso, na esfera parlamentar, não em gabinete de teóricos, como no caso
deste pensador.
O
fato é que a Constituição Federal, a grosso modo, assim define as suas
regras de competência: o que for de interesse Nacional resolve-se pela
União; o que for de interesse local, resolve-se pelos municípios; e o que sobrar, a competência residual, resolve-se pelo Estado.
Portanto,
ao menos no quesito Segurança Pública, vejo que há uma terrível
distorção e desrespeito ao pacto federativo, não se atende ao princípio
da subsidiariedade e nem as regras de competência contidas na
Constituição Federal.
Em
um pais de dimensões como o Brasil a realidade local difere de região
para região. Assim, compreensível que cada município faça da sua guarda
municipal um instrumento de soluções dos problemas de segurança pública “conforme dispuser a lei”.
E de que lei estamos falando?
A Constituição Federal, quando se refere à criação das guardas municipais, estabelece que a sua atuação se dará “conforme dispuser a lei”.
Trata-se
de uma expressão ainda controversa na doutrina. Alguns pesquisadores
entendem que a faculdade de dispor sobre o funcionamento da Guarda
Municipal contida na Constituição Federal com o termo “conforme dispuser a lei” se
refere ao fato da necessidade de ser criada uma lei federal que
regulamente as atribuições, funcionamentos e carreiras de todas as
Guardas Municipais do Brasil. Para outros, essa expressão está
relacionada à faculdade de cada município em dispor sobre a destinação
da sua Guarda Municipal – respeitados os limites constitucionais;
definindo o seu funcionamento; sua carreira e sua imagem (uniformes,
denominações etc.)
Existe
um trabalho que está sendo realizado no âmbito do Governo Federal para
criar o “Marco Regulatório das Guardas Municipais”, trançando diretrizes
gerais para o funcionamento de cada uma delas, visando uma maior
padronização para que sejam reconhecidas e identificadas em todo o
território nacional de uma só forma.
O
fato é que em cada município a Guarda Municipal atua da forma que rege a
legislação local. Algumas portam arma de fogo, outras, mesmo possuindo
autorização legal, optaram por não portar (ex. GM do Rio de Janeiro). A
grande maioria adotou o azul marinho como cor do uniforme. Existem as
mais variadas denominações para os cargos, e as mais variadas carreiras.
Quanto
às atribuições, estas também variam de município para município – ex:
atuação na fiscalização no transito; fiscalização do comércio das vias
públicas; proteção das pessoas; proteção ambiental; defesa civil;
fiscalização da lei do silêncio, mediação de conflitos etc.
Por conta de todas essas variações, a nós parece que o termo “como dispuser a lei” está
sendo melhor aproveitado na autonomia de cada município em legislar
sobre a função e a atribuição de cada guarda municipal, voltada para o
atendimento das necessidades locais.
Se
passarmos a defender a interpretação do termo “conforme dispuser a lei”
como sendo a liberdade de uma cidade legislar a respeito da destinação
das prioridades de atendimento da sua guarda municipal, conforme a
realidade local e o melhor aproveitamento dos seus interesses, no
quesito segurança pública, estaríamos diante de um grande passo para
promover o respeito ao princípio da subsidiariedade e das regras de
competência traçadas na Constituição Federal, chegando então, bem
próximo do que vem a ser o verdadeiro federalismo.
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